O Sétimo Selo (1957) é uma obra do cineasta sueco Ingmar Bergman (1918-2007).
A obra de Ingmar Bergman revela o retorno do cavaleiro Antonius Block e seu companheiro Jöns da região das cruzadas para a Suécia, esta assolada pela Peste Bubônica. Antonius Block, contrafeito à dignidade das cruzadas, perdeu o seu tonos de ligação com a religião e agora tenta auscultar o silêncio de Deus.
A sequência inicial, retratada pela câmera de Bergman, expõe a imagem de um céu que, apesar da presença de nuvens, encontra-se “vazio” e logo dá lugar a um pássaro que se materializa na Morte, a qual, em uma praia rochosa do litoral sueco, vai de encontro a Antonius Block para “levá-lo”. O vislumbre de que sua vida está propensa à morte, sem a guarnição da dimensão da eternidade, cria uma atmosfera agônica e, na tentativa de protelar a Dança da Morte, ele a convida para uma partida de xadrez.
Há uma cena seguinte em que o cavaleiro Antonius Block, montado em seu cavalo sobrelevado, observa o céu, enquanto seu escudeiro Jöns, montado em um cavalo mais baixo, assume uma postura mais pragmática em sua visão de mundo, contrapondo o cavaleiro e tentando evidenciar a vã tentativa de conclamar os céus. A cena pode remeter à capa original do clássico romance de Miguel de Cervantes, Dom Quixote de La Mancha, evocando também o célebre momento em que Sancho Pança adverte seu mestre: “não são dragões, e sim moinhos de vento.”
A dinâmica entre o cavaleiro e o escudeiro composta por Bergman é semelhante àquela criada por Cervantes. O pragmatismo irônico de Jöns contrasta com as inquietações filosóficas de Antonius Block.
Bergman realiza um trabalho minucioso de pesquisa histórica e reconstrução da época para retratar a Idade Média sueca, mas vai além, ao utilizar um vasto simbolismo em suas cenas, resgatando no passado questões que permanecem no mundo contemporâneo.
Onde está Deus diante do sofrimento agônico que a Peste Bubônica dissemina? Qual o sentido da vida, se é que ela possui algum? Por que ele aderiu às cruzadas? São questionamentos que percorrem Antonius Block ao longo da narrativa. Transpassando o medo da morte, suas inquietações se voltam, sobretudo, para o silêncio divino, a ausência de sentido e a dúvida sobre a validade de suas escolhas. Bergman constrói, através de Block, uma figura que personifica o homem diante da finitude e da incerteza.
Entendimentos como o esvaziamento da igreja, a falta de coesão da fé senão pelo medo e a força da inquisição aparecem em simbologias retratadas nas cenas. No diálogo emblemático em que Antonius Block, na sacristia, busca confessar-se a um clérigo, depara-se com a Morte ocupando o lugar do sacerdote. A simbologia de sua presença ali, naquele espaço sagrado, é apenas uma entre tantas imagens carregadas de sentido que permeiam a obra.
Enquanto Block busca sondar a natureza de seus questionamentos, existe em Jöns quase uma tentativa de reconciliação com as contradições do mundo, ressaltando a dinâmica de enfrentamento das personagens. É Jöns o responsável por ajudar Jof, o ator, a sair da taberna após ser encurralado. É também ele quem, ao reconhecer Raval, antigo teólogo, agora reduzido a roubar dos mortos e ameaçar uma jovem, o repreende e intercepta.
A narrativa apresenta outros personagens que acompanham o caminho de Block e Jöns, como o ferreiro Plog e sua esposa, e os atores Jof, Mia e seu filho Mikael, não menos densos e simbólicos que o cavaleiro e seu escudeiro.
Em uma das cenas finais, as personagens se veem diante da Morte, e a singularidade de cada uma se revela na maneira como reagem a ela.
Enquanto visualizamos a cena emblemática final, Jof narra para Mia a cena que está vendo:
"À frente vai o rígido mestre com a foice e a ampulheta,
Mas o tolo vem no final, com seu alaúde."
O conceito de Dança da Morte remete a uma representação medieval muito comum durante o período das pestes na Europa. Nela, a Morte aparece conduzindo pessoas de todas as classes sociais em uma procissão, simbolizando a igualdade de todos diante do fim inevitável.
Talvez a única instância humana verdadeiramente democrática seja a morte. Pois, na Dança da Morte, não importa a condição em que se encontra, protelá-la até onde se quer não é possível.
O título O Sétimo Selo faz alusão direta ao Livro do Apocalipse, capítulo 8.
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